Sensações de um Prêmio Nobel

Adilson Roberto Gonçalves

IPBEN Unesp Rio Claro

Os premiados deste ano no Prêmio Nobel em Medicina/Fisiologia foram o norte-americano David Julius e o libanês Ardem Patapoutian (imagem Niklas Elmehed/Nobel). Ambos trabalham em instituições nos Estados Unidos e talvez esse país seja computado como a origem de ambos os laureados. Eles estudaram como se dão as percepções de temperatura e tato, os receptores que transformam essas sensações em impulsos elétricos levados ao cérebro (veja matéria aqui). Um dos estudos usou a capsaicina, substância picante presente na pimenta-malagueta e também usada na composição do gás pimenta.

Esse material faz parte dos equipamentos de defesa, uma vez que tem produção controlada e restrita a empresas com alvará para armas de forma em geral. Em Piquete, no Vale do Paraíba, a Imbel - Indústria de Material Bélico do Brasil - é uma dessas empresa. Ela é estatal e produz artefatos de defesa e de segurança (https://www.imbel.gov.br/). A criação da Faculdade de Engenharia de Lorena (Faenquil) que hoje é um campus da USP como Escola de Engenharia de Lorena promoveu o intercâmbio de alunos e professores com a empresa, tendo egressos lá trabalhando e profissionais da Imbel atuando em atividades docentes e administrativas da Faculdade. A dosagem de capsaicina nos dispositivos fabricados pode ser feita por técnicas químicas analíticas, usando especialmente cromatografia, mas as especificações, metodologias e padrões também ficam condicionadas a procedimentos de segurança institucional.

Nas manifestações de rua, o gás de pimenta é largamente utilizado pelas forças policiais presentes. Há informações equivocadas na internet afirmando que o uso de lenços embebidos com vinagre atenua o efeito de queimação desse gás. Uma vez em contato com a pele, a sensação é imediata, fato utilizado pelos cientistas que ganharam o Nobel para identificar sensores de tato e avaliar seu comportamento e desempenho. Aos manifestantes, o uso de leite, azeite ou mesmo álcool pode aliviar o ardor, uma vez que a capsaicina é insolúvel em água.

Em contraponto, o prêmio IgNobel, divulgado há um mês, teve como um dos ganhadores na categoria química a pesquisa para avaliar se aromas exalados por quem assiste a determinados filmes em cinemas têm relação com o nível sexual, de violência, uso de drogas, questões anti-sociais e de linguagem chula do que é projetado na tela (https://www.improbable.com/2021-ceremony/winners/). Os sensores foram outros (olfativos) em relação ao Nobel de Medicina, mas também o estudo se relaciona a atividade social importante.

Parece que pimenta nos sensores alheios pode ser refrescada com um prêmio dessa magnitude.